3% | A série brasileira original Netflix que você respeita
A primeira série brasileira original Netflix tem dado o que falar. Por um lado, a maioria dos veículos de comunicação nacional têm escrito diversas críticas medianas e negativas sobre a série, em contraste às boas recomendações dos meios internacionais. Por que isso acontece? É muito claro que o mercado brasileiro no geral não é muito […]
A primeira série brasileira original Netflix tem dado o que falar. Por um lado, a maioria dos veículos de comunicação nacional têm escrito diversas críticas medianas e negativas sobre a série, em contraste às boas recomendações dos meios internacionais. Por que isso acontece?
É muito claro que o mercado brasileiro no geral não é muito favorável ao seu produto interno. Blockbusters e franquias hollywoodianas massacram as produções nacionais nas vendas de bilheteria no Brasil. E isso não se deve só ao fato de que nos EUA o dinheiro investido nas produções é incrivelmente maior do que aqui, se deve também ao status quo. Como é que é? Vou explicar:
Produções nacionais só são aceitas pela massa se for comédia carioca da Globo Filmes ou sobre a dura realidade de pessoas pobres que vivem em lugares afastados, no sertão – estes, aliás, são filmes que pessoalmente amo muito, um produto literalmente nacional com roteiros dos quais não há nada igual em nenhum outro lugar no mundo. Mas quando uma grande produção nacional não se encaixa nesta caixinha: Boom! Ela já será vista com maus olhos antes mesmo de ser lançada. Não é a primeira tentativa de se fazer ficção científica no país, mas é a primeira de âmbito internacional (alô, alô, ela está distribuída na maior rede de streaming do mundo para 190 países).
Uma ficção científica normalmente se passa em uma sociedade futurística, mas o que a faz tão especial é a conversa que o que ela propõe tem com a sociedade hoje. Na verdade, o sci-fi é o hoje, sempre foi, e é por isso que nós nos envolvemos e nos identificamos tanto com a narrativa. 3% se passa nesta sociedade futurística e distópica tratando de política em entrelaço com a tão polêmica e discutida meritocracia (Quer momento mais propício que o atual para se falar disso no Brasil e em todo o mundo? É o timing perfeito!). Não é a toa que dois dos maiores livros deste segmento são atemporal, clássicos – 1984 de George Orwell e Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley.
As comparações com blockbusters e franquias hollywoodianas são inevitáveis, mas comparar de igual para igual é não ter senso crítico algum. 3% é o pontapé inicial brasileiro para este segmento, e se saiu tão bem que me surpreendeu, e olha que sou muito chata para filmes e séries. Lógico que há algumas falhas no roteiro, algumas conversas precisariam de falas mais maduras, talvez não foram para conseguir atingir um número maior de pessoas, além de seu público-alvo, mas ei, vamos dar uma chance…
Na pele de Ezequiel está o baiano João Miguel (Cinema, Aspirinas e Urubus; Estômago), um dos atores mais consagrados do cinema nacional, com atuações impecáveis e monstruosas. Bianca Comparato também traz toda sua experiência para brilhar na série como Michele. Mel Fronckowiak está começando a construir sua carreira agora, mas dá um show de interpretação no único episódio em que participa como Julia. E aquela surpresa mais que agradável das grandes revelações da série? Vaneza Oliveira (Joana) e Rodolfo Valente (Rafael) são os maiores exemplos para mostrar que os protagonistas originais não eram os que foram vendidos no trailer… E, claro, a diversidade de atores: Finalmente vemos o Brasil verdadeiramente representado em tela com pessoas das mais diversas cores, gênero e idade sem necessidade de gritar por isso, é tudo colocado da forma mais natural possível.
Não dar chance para este grande segmento em crescimento em todo o mundo para o Brasil é como estar com a faca e o queijo na mão e deixar que o queijo escorregue e a faca te corte.